Entrevista com Fabyola Soares

Entrevista com Fabyola Soares

Ela começou sua carreira profissional como Comissária de Bordo. Foi nas rotas internacionais que teve mais contato com o tema vinhos e harmonização. Depois de uma bem sucedida jornada no Brasil como Embaixadora de Marca para a Maison Perrier-Jouët, hoje, a Fabyola Soares é Global Senior Education Manager Champagne & Provence para a Martell Mumm Perrier-Jouët e há 8 anos mudou-se para a França.

Como foi a sua entrada no mundo do vinho?

Em 2006, comecei a trabalhar como comissária de bordo e tive meu primeiro contato com vinhos e harmonização ao ingressar nas rotas internacionais. Após me formar na faculdade de administração, viajei para a Grécia e a Itália para visitar alguns dos lugares que
mais me fascinavam e estudar história da antiguidade. Durante essa jornada, tive a oportunidade de provar vinhos mega acessíveis e ao mesmo tempo excepcionais. Eu queria trabalhar com história, mas ainda não sabia como, e comecei a ver o vinho como uma possível porta de entrada quando entendi que os vinhos possuem a notável capacidade de tornar a história praticamente tangível, permitindo-nos viajar através do tempo e do espaço, além de desempenharem um papel fundamental no âmbito da gastronomia, expressando de forma autêntica a cultura e a forma de vida de cada região produtora.

Ao retornar a São Paulo, decidi me inscrever no curso de sommelier oferecido pela ABS (Associação Brasileira de Sommeliers). Inicialmente, era apenas um hobby, mas com o passar do tempo, estabeleci meu negócio de consultoria e conheci muitos profissionais incríveis que me inspiraram a continuar os estudos (com o WSET e o Wine Scholar Guild), buscar novas certificações e manter meu interesse cada vez mais aguçado. No final de 2013, minha carreira tomou um rumo surpreendente com amplitude internacional quando fui convidada a me tornar a primeira sommelière embaixadora do Champagne Perrier-Jouët no Brasil, e fazer parte do grupo Pernod Ricard.

Você atua no mercado de vinhos da França há alguns anos e lida diretamente com
diferentes outros mercados. Como surgiu essa oportunidade e quais foram seus maiores
desafios durante a transição?

Em 2017, tive a oportunidade de integrar nosso time global em Paris, para trabalhar em nossa filial de vinhos prestige franceses. Ao longo dos anos, assumi diversos papéis, primeiramente na equipe transversal de aceleração de negócios (onde fui responsável por mercados em crescimento como Américas, África e Pacífico, e depois pelos mercados líderes como Japão e Europa).

Em 2019, assumi um novo desafio na equipe de marketing estratégico de longo prazo, trabalhando exclusivamente na construção de marca da Maison Perrier-Jouët, e em 2022, após concluir o Diploma WSET em Bordeaux, abracei meu cargo atual de gerente global de educação do portfolio prestige Champagne e Provence.

O maior desafio de todos foi mudar para a França sozinha, deixando família, amigos e namorado para trás. Sempre trabalhei viajando muito, mas nunca havia morado sozinha, muito menos ficado sem rede de apoio. Trabalhar 100% em outras línguas (Inglês e Francês) era exaustivo no começo, porém além da língua em si, havia também a energia gasta em entender como navegar multiplas novas culturas (a do país no qual eu estava vivendo e as culturas de cada um dos mercados nos quais estava atuando). No primeiro ano, me questionei algumas vezes se havia tomado a decisão correta. Na época, um colega de trabalho americano compartilhou uma dica de leitura que foi  muito valiosa, era um livro chamado “The Culture Map: Breaking through the invisible” da autora Erin Meyer. Esse livro foi incrível e me ajudou muito a entender melhor como navegar e me comunicar com diversas culturas que não necessariamente pensam e interagem como nós brasileiros.

Faby quais os pilares para um bom desenvolvimento de marcas de luxo no vinho? Quais os
obstáculos também?

As marcas nas quais tenho atuado são centenárias e reconhecidas globalmente. Acredito que tanto em relação ao estilo do vinho em si quanto à estratégia de marketing e ativação, será sempre necessário ser coerente e consistente:

– Coerente com o que foi construído no passado e com os valores estabelecidos
pelas gerações anteriores à nossa (sempre imagino que estou escrevendo um novo capítulo
da mesma história, e não um novo livro)
– Consistente entre o que é dito e o que é feito por cada equipe, todos os dias, em
todos os projetos, sempre com atenção extrema ao detalhe e uma obsessão constante pela
excelência

Aliado a esses pilares, precisamos ter os pés no chão, entender nossos mercados, nossos clientes e consumidores, ter uma visão holística para que possamos decodificar como continuar construindo um legado autêntico para essas marcas no futuro, preservando sua singularidade, mas também respondendo às expectativas das próximas gerações. Em Champagne especificamente, precisamos ser pacientes e, muitas vezes, prever não apenas como nossos vinhos evoluirão ao longo dos anos, mas também como a sociedade irá evoluir.

Imagine que, quando um champagne é engarrafado, este será vendido daqui a 3, 6 ou até 10 anos. As decisões tomadas nesta safra em relação à viticultura, vinificação e até mesmo a embalagem não serão julgadas pelos consumidores com os olhos de hoje, mas com os olhos e a mentalidade de amanhã. É necessário tomar decisões antecipadas e sempre buscar novas soluções para torná-las constantemente viáveis.

O mercado tem altas expectativas em relação aos vinhos de prestígio e espera que essas
marcas tenham um papel de liderança em sedimentar o futuro, criar novas tendências e
viabilizar a produção de vinhos da mais alta qualidade com o menor impacto ambiental e
social possível.

Hoje você é Gerente Global de Educação para uma das maiores empresas do ramo, e que também é bastante consolidada dentro do mercado premium. Conta um pouco do seu dia a dia e das suas conquistas nessa cadeira?

Hoje, orquestro junto com minha equipe o desenvolvimento e execução de todos os treinamentos que elaboramos para nossas Maisons em Champagne e em Provence. Gerencio nosso programa global de relacionamento com chefs e sommeliers de alta gastronomia, e também sou responsável pelo recrutamento e desenvolvimento de nossa equipe de embaixadores de marcas. Temos 25 embaixadores baseados em 15 mercados internacionais, incluindo Europa, Américas, Ásia e Pacífico.

Nossos embaixadores desempenham um papel vital na construção de relacionamentos com nossos clientes e parceiros. Portanto, buscamos perfis sêniores com experiência substancial na indústria do vinho durante nosso processo de recrutamento. Uma vez que fazem parte de nosso programa, eles embarcam em uma jornada de crescimento profissional a longo prazo, adaptada às suas aspirações de carreira. Nos esforçamos continuamente para desenvolver e implementar programas de educação e certificação de alto nível, frequentemente em colaboração com autoridades globalmente reconhecidas no mundo do vinho e do luxo.

Nos últimos 2 anos, iniciei uma escola interna onde ofereço para os nossos embaixadores e times de marketing as certificações do WSET nível 1, 2 e 3, e também o Certificado Especialista em Champagne, que desenvolvi junto com o Wine Scholar Guild e a Essi Avellan Master of Wine. Desenvolvemos um calendario com encontros anuais na França e treinamentos bimestrais com especialistas em viticultura regenerativa e vinificação sustentável, bem como especialistas do mercado de vinhos finos e parceiros da alta gastronomia.

O que a Fabyola de hoje falaria para a Fabyola no início de carreira?

“Enjoy the ride” – aproveite e saborei o processo porque no final é sobre a jornada e
não apenas o destino. Parece obvio, mas nao é fácil fazer. Quando comecei o Diploma WSET, comprometi-me a terminá-lo em 18 meses (ou seja, eu teria que passar em todas as provas na primeira tentativa, e como trabalhava durante o dia, estudava à noite e nos fins de semana). No final, consegui, graças ao incrível grupo de estudos que encontrei – estudávamos teoria duas vezes por semana das 20h às 23h30, degustação às cegas todas as segundas das 19h às 22h e revisão com flash cards nos  finais de semana. Para ir as aulas em Bordeaux, usei todos os meus dias de férias. Foi super intenso, mas maravilhoso. Se fosse fazer novamente, colocaria menos pressão e aproveitaria mais a companhia de cada pessoa que encontrei na jornada. Meu próximo desafio será o Master of Wine, e quero muito tentar colocar esse mindset em prática.

Assinatura Vinhos Única Jessica Marinzeck

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